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sexta-feira, 5 de agosto de 2011

A dimensão profética da poética do Fruto Sagrado

Esse provavelmente é o título imaginário de um projeto de pesquisa que nunca realizarei. Um projeto que daria muito gosto fazer, mas que não encontra espaço na minha agenda. Enfim, deixe-me comentar um pouco sobre a ideia.

As letras do Fruto têm algo que me lembra os profetas do Antigo Testamento. Há nelas uma despudorada coragem de meter o dedo na ferida, apontar as fraudes, reclamar justiça. Suas mensagens, como as dos profetas, não são elaboradas com o intuito de agradar aos nobres deste mundo. Pelo contrário, escancaram sua participação na desgraça alheia. Também não visam afagar a cabeça do povo. Trazem notícias ruins, de tempos difíceis, mas sem perder a direção da esperança.

A dimensão profética da poética do Fruto Sagrado está no conteúdo de suas letras, no engajamento de sua atitude, no modo de enunciação - urgente e sagaz. Ela se revela não por autoaclamação, mas por semelhança com os profetas vetero-testamentários.

Ironicamente, aqueles que se dizem profetas hoje apresentam um discurso muito diferente do que lemos na tradição profética. Falam de demônios, de exu não sei das quantas, de principados territoriais, de bênçãos particulares e vitórias materiais específicas de um ou de outro. Nada disso encontro nos Profetas quando leio as Escrituras. Suspeito que o profético pode não estar na "adoração profética", no "ato profético" ou nos "profetas" da tv. Nesses, só o significante aparece na superfície da língua. Mas o significado habita lugares inesperados. O profético, essa tensão de proximidade com o divino que transborda em um discurso a partir de um montinho de poeira (o ser humano), pode emergir em forma de música na ousada escrita do Fruto Sagrado.

E a importância de se atentar para a semelhança entre as letras do Fruto com o projeto dos Profetas reside no fato de que ela revela, além da urgência de uma atuação transformadora da Igreja no contexto presente, a distância que há entre os pretensos discursos "proféticos" de nosso tempo e a verdadeira profecia.

Hoje, o apelo ao individualismo e às vaidades pessoais transformou a tradição profética e a trouxe cativa para o âmbito de nossas mediocridades cotidianas. "Deus cumpriu sua promessa" - diz o adesivo no vidro do carrinho, sugerindo que aquele veículo tinha sido prometido pelo Eterno. E muitos se agradam com esses joguinhos "proféticos" e essas suaves manipulações com a palavra alheia. Mas se esquecem que a Palavra Alheia da profecia tem dono. E o Dono pode não gostar desse circo que montaram.

Quer dizer que não creio na atualidade do profético? Pelo contrário. Creio plenamente. Mas suspeito que o verdadeiro profético está onde a maioria não gosta de procurar. Porque o profético incomoda. O profético não massageia o ego (como se faz em muitas igrejas que se acham cheias de "profecias" e "revelações"), mas desperta o espírito. 

O profético só existe pelo Espírito de Deus (quero dizer, ele não é de modo absoluto, mas se sustém a partir do Consolador), que fala o que se precisa ouvir, não o que agrada. O profético se esconde em músicas que não fazem dormir nem sair do chão (pular, correr e gritar etc.), mas que nos deixam estarrecidos e que nos levam ao pranto. Há algo de profético no Fruto Sagrado? Houve? Acredito que sim. Como acredito que há algo de profético em muitos púlpitos ainda hoje. Mas ninguém quer escutar.

P.S. Está grande a postagem, mas não posso deixar de mostrar a música que a motivou. Acontece que no blog A Pedra eu comentei um texto sobre a ganância de um dos muitos pop-pastores que disputam espaço nos domínios televisivos com uma música do Fruto que é a seguinte:




Recebi um dossiê com a tua história,
O teu passado, o teu presente.
Não tenho boas notícias
Sobre o teu futuro!
Você até começou bem,
Cheio de boas intenções,
Uma fogueira ardia
Em teu coração...

Mas se vendeu por trinta
Moedas de prata,
Se apaixonou pelo gosto
Do vil metal,
Se acorrentou em sua
Conta-corrente,
Sua pregação virou um medíocre
Apelo material!
Alguns amigos tentaram te avisar,
Te alertar, lembrar do primeiro amor!
Agora é tarde, eu tenho que te levar,
E não é pro lugar que você
Tanto sonhou...

Teu tempo acabou,
Teu tempo acabou...
Pediram a tua alma
E essa noite eu vim aqui
Só pra te levar!

E agora, onde você vai colocar
Tanto dinheiro, tanto cifrão?
Não adianta ficar aí, parado,
Me olhando com essa
Cara de bobão!
Vai estacionar seu Audi aonde?

Lá em Miami ou em Hong Kong?
Valeu a pena trair
Quem sempre te amou?

Essa grana não consegue
Me subornar
Eu cumpro ordens!
Tô aqui só pra te levar
Sem lenga-lenga, sem lero-lero...
Porque o juiz já bateu o martelo!
Alguns amigos tentaram te avisar,
Te alertar, lembrar do primeiro amor!
Agora é tarde eu tenho que te levar,
E não é pro lugar que você
Tanto sonhou...

Teu tempo acabou,
Teu tempo acabou...
Pediram a tua alma
E essa noite eu vim aqui
Só pra te levar!

Nem mais um minuto, mané!
Nem mais um segundo sequer!
Nem mais um instante qualquer!
Teu tempo acabou!

Teu tempo acabou,
Teu tempo acabou...
Pediram a tua alma
E essa noite eu vim aqui
Só pra te levar!

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